A mulher que não chora
Teve um dia em que minha avó nunca mais chorou.
Quando eu perguntava se ela não sabia chorar ela me contava da vez em que chorou toda água da vida e depois disso, nunca mais.
Foi na morte da mãe dela. Ela buscou o meu tio na escola e dirigiu aos soluços sem conseguir se explicar. Meu tio também contava as memórias sobre esse dia em que a dor da minha avó secou.
Eu penso nas pessoas que não vertem os sentimentos e lembro da minha avó contando que nela tudo ficava guardado. Ela emanava em forma de histórias, olhando a lua, suspirando à janela; mas transbordar mesmo, não mais. Dizia: "Eu queria chorar como vocês fazem. Mas o meu choro chega na garganta e volta pro peito." Lembro dela contando o caminho da dor, que deslizava pelas lembranças e sempre aterrava no coração. Doía, como a toda gente. Mas transbordar mesmo... Isso, não.
Minha avó dizia que chorar era bom. Pelo menos pra mim. Às vezes ainda escuto ela dizendo: "Chora, chora tudo o que tiver aí dentro. Aí levanta pra vida!".
E se eu penso em guardar no peito a água de dor que conduz o mundo, eu lembro que sou navegante. E o mundo é mar salgado. Tem que seguir adiante.
Eu achei que também não mais choraria quando a perdesse, como foi com ela em sua perda triste. Chorei toda a dor da vida, quem me viu no canto da despedida deve bem se lembrar. Foi tanto derramar do dia que minha perna virou água e eu caí de vez, exaurida, bem na frente do caixão. Achei que tinha chorado toda a dor na madrugada. E depois, dias e meses. E depois, secado enfim.
Mas como um rio, a vida deságua e corre, e corre...
E quem viu também: perdi mais gente. Foi mais lágrima pra história.
Enfim, talvez algum dia eu seque de tanto nos cantos do mundo transbordar.
Mas, ao menos por agora, me embala a voz que diz: "Chora. Chora, menina. Chora..."
[7 de junho de 2023].