Miragens na casa seis
Uma vez eu casei de branco na beira do sonhos. Na primavera que voava entre as janelas de madeira da casa seis. Arrastei um véu de histórias bonitas pelas escadas de outubro. Cheguei no jardim amarelo que me envolveu no calor dos esconderijos das manhãs. Minhas asas flutuantes coloridas subiam como o vento de maio ao pensarem nas águas dos dias da infância que faziam poça no chão. Subi como vagalume da tarde pro centro do casarão, e estava ela lá, destacada nas paredes verdes como um quadro bonito a me abençoar. Ela me olhou de relance e profetizou: "Agora é só paz, menina. Voa pra lua, pra me visitar."
Eu voltei vestida de tule pelas pedras frias ensolaradas da casa quente. Encontrei um radinho de pilha que tocava bolero ninando minha história. Encontrei fotos da década perdida, douradas, com olhares que trepidavam sorridentes ao me vez finalmente sorrindo. Depois, um cabelo branco como neve me beijou a testa e disse: "Vai, coração.", me apoiando nos braços. E parti prum teatro bonito e bordado num circo onírico de verso e de luz.
Eu casei feito noiva que flutua e sonha desde criança na imaginação.
Foi assim que encontrei a vida, parada na beira do tempo, depois de toda uma prece pela estradinha sinuosa. Casei por amor. Comigo, com os olhos mais lindos e com a vida. Feito miragem, adornada na mais pura devoção.
[24 de maio de 2023].