Morta e navegante
Queria estar morta no mar profundo
da saudade serena do mar.
E numa dor desaguar
de angústia todo um mundo.
Morta e navegante
em agonia escamada
no choro da madrugada
que invadiu a costa.
Queria estar à deriva
nas águas onde nasci,
salgada em suor e esforço
da vida que não vivi.
Queria morrer naufragada,
boiar sem rumo, arenosa,
entre algas, majestosa:
minha pele esverdeada.
Morta e purulenta
no mar mais vivo do mundo.
Que me beijasse profundo
o sangue do continente.
Queria afogar em mim,
escaldada em água ardente,
morta, verde - e ainda assim,
mais viva que toda a gente.
[11 de abril de 2023.]