Tapete verde

Dia desses eu contava a um amigo de literaturas, do circo que cabia na caixa de panelas da minha avó. No tapete verde, eu despejava utensílios. Era dia de festa, de trazer um mundo para a sala. Arrastava a mesa e o chão ficava imenso demais para as crianças imaginárias pequenas que visitavam o meu grande parque. As panelas e coisas eram brilhantes, bonitas, coloridas, cheias de magia, autênticas montanhas-russas e colossais rodas-gigantes. Eu não sei quando foi que elas viraram só panelas...

Eu montava o parque ao redor do circo que cabia na sala de estar. Lembro da panela de fondue que virava o brinquedo radical giratório onde as filas se formavam. Certa vez, perguntei para a minha avó pra que servia uma panela de fondue. Não lembro da resposta. Mas entendi que servia para girar crianças e fazer elas gargalharem. O meu parque era um sucesso. O maior sucesso dos meus dias cabia dentro de uma sala. Depois, dentro de uma lembrança. 

Tinha a esteira de colocar pratos, que virava a área de alimentação. Uma vez eu acendi minúsculas velinhas de aniversário para fazer a iluminação do ambiente. Minha avó me ajudou. E também me ajudou quando elas quiseram incendiar o tapete. Após tantos aniversários, aquelas velas já eram adultas demais para brincar de circo. Foram devidamente expulsas. "Sem velas, na próxima vez!". Sem adultos que atrapalhem, também. No meu parque só cabiam crianças felizes. E eu. 

Mas tenho que dizer que, ter ido tantas vezes ao circo da sala da minha avó, me tornou uma pequena circense nata. Eu era apaixonada pelo circo desde criança, das idas ao picadeiro aos brinquedos temáticos que ganhei. Anos depois, eu não tive mais tempo ou costume de brincar no tapete. Eu não sei como desaparecem esses hábitos. Depois, foi a minha avó que desapareceu. Mas mora em mim um parque imenso, iluminado e colorido que se acende cada vez que sinto um sopro de lembrança das noites no tapete verde da casa de infância. Um parque se acende, eu volto pro circo, penduro nos brinquedos e - mais uma vez - sou feliz. 

[5 de março de 2024.]