A vila das casas de vó

Entre as coisas mais bonitas que moram nas casas de vó, existe uma saudade mansinha que dorme na janela e sopra os ventos frios das madrugadas. 

Também há todo o arsenal congelado das gavetinhas. De uniformes da escola, que não viram o tempo passar. Fotos de momentos guardados bem no peito dos dias bons. Coisinhas miúdas que contam histórias e cartas que, juntas, me lembram quem sou. 

E os azulejos dos banheiros floridos com um jardim que não morre nas lembranças. Dizem que um banho na casa de vó é capaz de lavar até a dor da saudade mais profunda, transformando o mundo em cachoeira. 

Tem natais nas casas de vó. E presentes da manhã seguinte que, embora a vida corra, pulsam vivos nas memórias. É presente ter amanhecido, um dia que seja, numa casa de vó. 

Nas casas de vó tem pássaros que vivem décadas e esperam atentos a troca de qualquer olhar. Também tem assobio, almoço completo, quintal molhado, riso alto e outros fantasmas a pairar. 
Tem flores de todos os tipos e redes de pano rústico e colorido, que balançam sem parar. 

Eu penso nas casas de vó como os lugares mais bem assombrados do nosso Brasil. Porque nelas moram momentos que confortam. E voltam. E abraçam as dores que o tempo fez de armadilha. 

E a beleza das casas de vó, é que elas ficam todas no mesmo lugar, uma do ladinho da outra, e são fáceis de acessar. Num aroma, som, sabor, num quadro guardado ou no olhar de qualquer um que esteja a lembrar. 
A vila das casas de vó é o maior e mais acolhedor lugar do mundo. E não há pessoa ou coisa que impeça, quem quer que seja, de entrar. 

[30 de dezembro de 2024]

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